Conflitos agrários: desobediência civil ou crime?

Edilene Lôbo, Paulo Henrique Brant Vieira

Resumo


O presente trabalho objetiva fomentar reflexões acerca da (im)possibilidade de criminalização das ocupações de imóveis rurais, perpetradas por movimentos sociais, desde que buscando oferecer resistência ao statu quo negativador do direito fundamental à terra, provocando o Estado a implementar políticas públicas de reforma agrária. Para se chegar às conclusões oferecidas lançou-se mão do método dedutivo hipotético, realizando retrospectiva histórica acerca da regulação da distribuição de terras no Brasil, exame da legislação mais recente tangendo regularização fundiária agrária e estudo da jurisprudência, chegando aos seguintes produtos: o estado da arte que identifica o processo político-jurídico de criminalização da luta pela terra; esta criminalização violando o paradigma de Estado Democrático de Direito; o descumprimento da promessa constitucional de erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais, num truque perverso de atribuir ao excluído a responsabilidade pela própria exclusão. A primeira conclusão diz que essa ideologização da luta pela terra, configurando-a como crime a fim de reprimir a resistência de grande massa de excluídos, se coloca como combustível a alimentar ainda mais a revolta e o robustecimento da resistência dos envolvidos em tais conflitos, até porque sem outros mecanismos de pressão. Em segundo momento concluiu-se que a ocupação pacífica de propriedades rurais, por si só, sem qualquer outro ato de violência, não se amolda à norma penal vigente no Estado brasileiro, eis que se revela legítimo instrumento de desobediência civil, intencionado mudança comportamental do Estado para efetivação da política pública de acesso à terra, que poderá ser exigida, inclusive, na via judicial.

Palavras-chave


Conflitos agrários. Desobediência civil. Política pública de acesso à terra.

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DOI: https://doi.org/10.5102/rbpp.v7i2.4802

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