Violência contra mulheres quilombolas: uma reflexão sobre a aplicação de uma perspectiva interseccional à luz da ideia de contrapúblicos subalternos delineada por Fraser

Maria Eugenia Bunchaft, Leonardo Rabelo de Matos Silva, Gustavo Proença da Silva Mendonça

Resumo


O presente trabalho investiga a relação entre a ideia de contrapúblicos subalternos e a adoção de uma perspectiva interseccional para o estabelecimento de políticas públicas de saúde, educação, direcionadas ao combate da violência praticada contra mulheres quilombolas à luz da Teoria da Justiça de Nancy Fraser, que enfoca um recorte de gênero, raça e classe. A pesquisa é relevante e se justifica, pois dados estatísticos mostram um percentual considerável de assassinatos praticados contra mulheres quilombolas com requintes de crueldade, sendo que a maior parte das vítimas são mulheres que desempenham papéis de liderança política nas comunidades. A carência de pesquisas sobre a violência contra mulheres quilombolas legitima a necessidade de futuros estudos sobre o tema. O trabalho é original, pois inexistem estudos acadêmicos sobre violência contra mulheres quilombolas que correlacionem a temática da interseccionalidade e a ideia da contrapublicidade subalterna. Conclui-se que os contrapúblicos não apenas desconstroem assimetrias da esfera pública maior, mas também controlam a efetividade de uma perspectiva interseccional em políticas públicas de combate à violência contra mulheres quilombolas. Como resultado, sustenta-se que as mulheres quilombolas devem transcender a perspectiva de vítimas passivas de opressões cruzadas e se autocompreender como sujeitos políticos efetivamente engajados nas redes de solidariedade dos contrapúblicos. A técnica de pesquisa é a documentação indireta (investigação bibliográfica). A pesquisa documental (documentação indireta) também é usada, através de coleta de dados indireta, que incide sobre fontes estatísticas primárias. O trabalho utiliza o método histórico-analítico de Fraser.

Palavras-chave


Mulheres; Quilombolas; Interseccionalidade; Contrapúblicos; Políticas públicas.

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DOI: https://doi.org/10.5102/rbpp.v10i2.6766

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