‘Meu mundo, minhas regras’: Direito Internacional, branquitude e genocídio do povo negro brasileiro

Karine de Souza Silva

Resumo


O objetivo do artigo é, a partir do estudo de caso do genocídio do povo negro brasileiro e do Tribunal Penal Internacional, demonstrar como o Direito Internacional (DI) performa a identidade racial negra como padrão internacional de criminalidade e a branca como ideal de inocência e de salvadora do mundo. O texto é inédito e original porque atesta como o Direito Internacional produz subjetividade e posicionalidades hierarquizadas racialmente, e mostra que os povos subalternizados no Brasil têm feito uso da gramática do genocídio como estratégia anti-racista para reagir contra violências estruturais, físicas e simbólicas. Diante disso, o texto, ao mesmo tempo que denuncia o DI como instrumento de opressão, de formulação e manutenção de subjetividades e posicionalidades hierarquizadas, e interpela o TPI como instância intencionalmente incapaz de punir os perpetradores do genocídio anti-negro em curso no Brasil, reposiciona as insurgências anti-sistêmicas negras e indígenas silenciadas como parte da história do DI. Este trabalho está inserido no campo do “Direito e Relações Raciais”, e utiliza metodologias e epistemologias fundadas nos Estudos Críticos da Branquitude e nas abordagens teóricas anti-coloniais, pós-colonais e decoloniais.

Palavras-chave


Direito Internacional; produção de subjetividades e posicionalidades; branquitude; Tribunal Penal Internacional; genocídio do povo negro no Brasil; resistências negras e indígenas.

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DOI: https://doi.org/10.5102/rdi.v20i1.8634

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