Sonhos em um estado suicidário: efeitos da impossibilidade do luto nas subjetividades contemporâneas

Fernanda Guerra Roman Náufel do Amaral, Pâmela de Castro Nogueira, Juliano Moreira Lagoas

Resumo


O presente trabalho teve como objetivo investigar os efeitos da pandemia da Covid-19 nas
manifestações oníricas das subjetividades brasileiras, procurando compreender o impacto
das práticas de gestão de crise adotadas pelo Estado brasileiro na elaboração do luto e na
produção de mal-estar no Brasil contemporâneo. Para isso, partimos da compreensão
psicanalítica de que os sonhos se apresentam como uma via privilegiada de acesso ao
inconsciente, sendo, consequentemente, um índice experiencial profícuo para a investigação
de determinado tempo histórico e de seus efeitos nos sujeitos por ele atravessados. A
metodologia aplicada foi de natureza qualitativa e exploratória, apoiando-se nos princípios
metodológicos da Análise do discurso (ORLANDI, 2015), em articulação com a teoria
psicanalítica dos sonhos (FREUD, 1900/2019). Tomamos como objeto de análise,
inicialmente, o discurso do Estado, categorizando e discutindo as estratégias necropolíticas
adotadas durante a gestão da crise pandêmica. A partir dessa discussão, evidenciaram-se
algumas das modalidades de assujeitamento, invisibilização e violência com as quais o
Estado operou para gerir a vida e morte, bem como alguns dos efeitos dessa gestão no
engendramento do trauma e do empobrecimento simbólico em nível coletivo. Em um
segundo momento, debruçamo-nos sobre os sonhos relatados por brasileiros ao longo da
pandemia, tentando tecer articulações entre as manifestações oníricas, o trauma e o luto
interditado socialmente ao longo dos últimos dois anos. Em meio a um contexto
simbolicamente empobrecido, atravessado por um momento de profunda transformação
social, e frente à desvalorização da atividade de sonhar na contemporaneidade, os sonhos se
mostraram uma via de resistência ao assujeitamento. Nesse contexto, a tarefa de recuperar a
capacidade de sonhar e de fazer do sonho um exercício de cidadania se impõe ao sujeito
contemporâneo como um desafio ético e uma forma de resistência ao cenário crítico que o
país atualmente atravessa. Valorizar os sonhos em sua potencialidade de elaboração dos
traumas e de construção de uma memória histórica coletiva, significa, antes de mais nada,
dar lugar e voz àquilo que o sujeito tem de mais singular: seu desejo


Palavras-chave


Sonhos; Luto; Psicanálise; Pandemia; Necropolítica

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DOI: https://doi.org/10.5102/pic.n0.2021.8904

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